— Salve escrivão. Vamos ao trabalho?
— Salve, meu amigo. Claro, ao trabalho, sempre o trabalho.
— Previno que o assunto não guarda tranquilidade, para dizer o mínimo. Porém, me vejo na obrigação de fazê-lo. Acompanhe:
A definição do que é atividade sexual, segundo o que conhecemos, pode-se dizer que é o encontro de genitália de corpos, numa definição grosso modo. Tampouco, definir uma experiência sexual não é nada simples. No senso comum, encontramos definições como: “fazer amor” e sexo por prazer, as mais comuns. No entanto, sexo por prazer quer dizer o quê? E fazer amor, é possível fabricar amor?
Se definirmos prazer, teremos algo que não passa de uma abstração, o “sentir prazer”. Pode-se sentir prazer em diversas coisas e atos, como exemplo: o prazer de fumar, de beber uma boa vodca, de assistir uma orquestra etc. Contudo, em momento algum, se pensarmos em prazer como o sentimos em diversos momentos diferentes, algum deles pode se comparar ao ato sexual? Para qualquer pessoa que já tenha experimentado o sexo, ao fazer uma analogia, existe comparação?
A pobreza de percepção instalada no seio dos seres humanos de hoje, aliada a banalização, fruto da revolução sexual iniciada no final dos anos de 1960, início dos 70, fizeram com que perdêssemos até a capacidade de expressar em palavras o que é o ato sexual.
Se pensarmos, em primeiro lugar, que vivemos aprisionados ao corpo, em situação de extrema solidão, onde passamos quase o dia todo, se não semanas e até meses sem tocar em qualquer outro corpo, senão toques esporádicos como um aperto de mãos, ou um breve abraço, beijos no rosto de “até logo”, nos leva a entender que de alguma forma, como uma criança chora pedindo o colo e o toque da mãe, o afago, o carinho que acalma o choro e faz dormir, reclamamos o toque de outro corpo, seja na condição social do matrimônio, amantes, e até desconhecidos que se cruzaram há poucos minutos, pouco importa. O que se busca, enfim, é fugir da solidão do corpo e buscar o toque.
Ademais, no ato sexual estão envolvidos diversos elementos não psicológicos, que levam a conclusão que, na troca de fluidos carregados de genética, genes da espécie humana, algo que fazemos desde tempos imemoriáveis, para perpetuação da espécie, mesmo que o ato em si não tenha a finalidade de procriação, fazem com que naquele momento, haja uma transcendência daqueles seres envolvidos, e podemos dizer que a humanidade toda participa do ato.
No nível da percepção, e são vários níveis experimentados durante o ato, estas vão esvaindo-se conforme o desenrolar, até chegar ao ponto de não haver mais percepções traduzíveis corporalmente, ou seja, notamos que a atividade cerebral possa estar extremamente reduzida, como em um estado de “quase morte”, feita a devida ressalva para os dois estados, um bem vivo, outro com a vida por um fio. No entanto, a percepção experimentada pelo “eu” durante o ato amplia-se para aquele que experiencia, como nas experiências de quase morte (EQM), porém, não são traduzíveis.
Assim sendo, percebemos o acontecido: no momento do ato sexual, as percepções corpóreas dão lugar as do “eu” — notem bem que não digo da alma ou do espírito, não há separação do conjunto para formação do “eu”. Para este ser completo, precisa do corpo, perispírito e espírito —, paramos de sentir apenas pelo corpo, e concluímos que acontece a união em um único ser, ou a união de almas, no sentido poético já descrito a longo tempo atrás. Mesmo para aqueles que buscam pelo sexo nos modismos de hoje, manipulados que estão pela nova era, pensando agir por si, os mecanismos são os mesmos, e a percepção acontece da mesma forma.
A ressalva que podemos fazer dentro desse contexto, aplica-se a prostituição, onde o(a) acompanhante utiliza-se do corpo como ferramenta de trabalho, restando ao contratante a percepção sexual, salvo se aconteça afinidade entre os dois. Mesma aplicação podemos estender ao caso do estupro; apenas um dos praticantes do ato terá a percepção sexual, restando ao outro somente a dor.
Pode ser que você, caro leitor(a) não entenda tudo o que até aqui foi explicitado, mas um simples exercício de pensamento; se analisarmos como um “esfregar de corpos”, tem o poder de desencadear um processo de ampliação de percepção do “eu”, fazendo com que aconteça quase uma anulação da percepção corpórea, haja vista não ser possível descrever o ato sexual em minúcias, suas percepções, até o clímax de uma relação; não podem mesmo fazer com que desperte em vos algo para analisar e pensar? Será possível ainda definir “sexo por prazer”, ou “fazer amor”? Não interpretem este limitado Espírito como a voz da verdade, nem concluam que minha humilde análise de tão rico tema seja conclusiva. Talvez apenas aos poetas, com toda a riqueza de suas almas e apurada percepção, seja possível tal descrição, contudo, abro a discussão.
Respeitosamente: Repórter A Noite.
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