Exu

Exu


As fitas gravadas por Lilian Ribeiro em entrevistas e discursos do próprio Caboclo das 7 Encruzilhadas são um verdadeiro tesouro da Umbanda, patrimônio a ser preservado para estudos e como forma de adentrar naquela realidade dos primórdios da Umbanda. Como já mencionamos, utilizamos aqui algumas transcrições, e sobre Exu sentenciou Zélio de Moraes em entrevista concedida a Lilian Ribeiro em 22 de outubro de 1970:

Lilian Ribeiro: Sr. Zélio, é sobre o trabalho dos Exus. Existem Tendas que dão consultas com Exus em dias especiais além das consultas normais de Pretos-Velhos e Caboclos. Como o Sr. vê isso?

Zélio: Eu sei disto, que há muitas Tendas que trabalham com Exus, eu não gosto porque é muito fácil se manifestar com Exu, qualquer pessoa médium, um mau médium se manifesta com Exu, basta ter um Espírito atrasado; ou também fingindo um Espírito, por isso não gosto e fujo disto, na minha Tenda não se trabalha com Exu por qualquer motivo.

Lilian Ribeiro: Mas o Sr. não considera o Exu um Espírito trabalhador como todos os outros Orixás?

Zélio: Depois de despertado, porque o Exu é um Espírito admitido nas trevas; depois de despertado, que ele dá um passo no caminho da regeneração é fácil ele trabalhar em benefício dos outros. Assim eu acredito no trabalho do Exu.

Lilian Ribeiro: Não haverá casos em que outros Orixás vibrando em outras Linhas não possam resolver de imediato alguns problemas de filhos e, não seria o Exu aí o mais indicado para resolver, por estar mais perto materialmente, por estar mais aceito nos trabalhos materiais?

Zélio: O nosso Chefe, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, nos ensinou assim, isto faz 60 anos, que o Exu é um trabalhador. Como na polícia tem soldado, o chefe de polícia não prende, o delegado não prende, quem prende são os soldados, cumprem ordens dos maiorais, então o Exu é um Espírito que se encosta na Falange, que aproveita para fazer o bem, porque cada passo para o bem que eles fazem vai aumentando a sua luz, de maneira, que é despertado e vai trabalhar, quer dizer, vai pegar, vai seduzir este Espírito que está obsedando alguém, então este Exu vai evoluir. É assim que o Caboclo das Sete Encruzilhadas nos ensinava.

Lilian Ribeiro: De que modo o Exu é um auxiliar e não um empregado do Orixá ou vice-versa?

Zélio: Eu não digo empregado, mas é um Espírito que tende a melhorar, então para ele melhorar ele vai fazer a caridade com as falanges, correndo em benefício daqueles que estão obsedados, despertando e ajudando a despertar o Espírito para afastá-lo do mal que ele estava fazendo, então ele se torna um auxiliar dos Orixás

O entendimento que nos passa o pai da Umbanda Zélio de Moraes é de que Exu e Pomba-gira não são Guias espirituais, portanto, seu trabalho na Umbanda é particular, não sendo igual ao de Caboclo e Preto Velho, acrescentando ainda que a invocação dos Exus deve obedecer às regras rígidas, não sendo chamados por qualquer ocasião. Escolheram o trabalho caritativo para buscar sua ascensão, e prestam seus serviços junto as falanges de Umbanda como auxiliares de grande valia.

Mestre Omolubá, em suas obras maestrais, legou-nos sobre Exu: A figura Exu – oriundo das plagas africanas – deixa de ser, na Umbanda, um componente enigmático, para firmar-se, com lógica e simplicidade, no esquema de uma comunidade astral extremamente operosa e responsável dentro dos limites impostos pelos mentores da religião de Umbanda.

… Na Umbanda, a palavra Exu titula uma instituição do plano astral, conhecida como a central dos Sete Focos, composta por milhares de criaturas desencarnadas (branca, pretas, mestiças, atuantes em diversas profissões) que prestam serviços entre os planos físico e astral da nossa terra. Estão dispostos em categorias e recebem a colaboração de espíritos denominados “quiumbas”, que se aferram no trabalho pesado, no desejo natural de serem admitidos na poderosa organização Central dos Sete Focos. (Omolubá,2015, p. 149-150)

Após estas referências de peso, inquestionáveis para nós meros estudantes de Umbanda, é tarefa fácil sentenciar que Exu e Pomba-gira na Umbanda nada tem de demoníaco ou seres desregrados, marginais do plano astral a serviço das trevas. Ora, todos umbandistas sérios reconhecem que Exu é um espírito que, apesar de ainda habitar os planos inferiores no astral está a serviço do bem e da caridade, operando ao lado dos Orixás e Guias de Umbanda. Os espíritos ascensionados que trabalham na religião precisam de auxiliares que tenham acesso aos planos inferiores, e uma certa liberdade para agir nestes locais. Exu e Pomba-gira sendo habitantes destes, portanto, são os tarefeiros indispensáveis na Umbanda.

O mundo em que habitamos, o plano físico, é uma cópia imperfeita do mundo espiritual, nos ensinam os Guias de Umbanda. As estruturas deste mundo são cópias das existentes no outro. As obras do médium Francisco Cândido Xavier, psicografadas por André Luiz, como “Nosso Lar”, retratam bem este quadro. Estruturas existentes no mundo espiritual já a muito tempo, agora são realidades no nosso; muitas ainda virão. Pois bem, se os mundos são cópias um do outro, entende-se muito melhor o papel de Exu: quando de uma incursão policial para prender malfeitores em áreas dominadas pelo narcotráfico, pedimos ao juiz que o faça ou solicitamos aos policiais treinados para tal empreitada? No astral, quando os Guias solicitam a retirada e consequente prisão de espíritos malfeitores, ordenam aos Exus e Pomba-gira que o façam, pois são espíritos que habitam os planos inferiores e, portanto, conhecem o território e todos os seus perigos. São hábeis em capturar, prender e neutralizar as ações de espíritos decaídos que, quando aferrados em seus planos contra encarnados, podem causar desde pequeno mal-estar, até doenças as mais graves, não sendo diagnosticadas pela medicina tradicional. Influem em nossos pensamentos, levando ao desgosto pela vida e sugerindo o suicídio, causam apatias, nervosismo e uma gama de outros males, inclusive financeiros.

O Exu e Pomba-gira de Umbanda, longe de serem aqueles que se vendem por uma garrafa de cachaça para causar estes males listados e muitos outros a nós, encarnados, são os que o combatem. Os espíritos decaídos, cultuados por outras modalidades religiosas, usam os nomes dos Exus de Umbanda para assim ganharem credibilidade frente aos incautos que vão em busca de seus serviços para ferir seus desafetos.

Existem hoje tendas de Umbanda – se é que podemos as chamar assim – que adotaram o estilo de trabalho de outras religiões, que não são nosso objeto de estudo, e usam os Exus e Pomba-gira para finalidades nada nobres. Somos cientes de que os verdadeiros Exus de Umbanda já os abandonaram, e ficaram os velhacos e sorrateiros malfeitores do astral, utilizando os nomes dos Exus de Umbanda, cobrando vultuosas oferendas para supostos ataques aos inimigos encarnados do solicitante, e tecendo redes que envolvem os desavisados que pactuam com estes espíritos. Afirmamos que a Lei de Causa e Efeito é implacável para todos nós, encarnados e desencarnados.

Dentro da Lei de causa e efeito, dizemos que também aqui a justiça divina necessita de executores, quando já exista um julgamento nos tribunais cármicos contra algum ser vivente, seja do mundo dos vivos ou dos mortos. Exu e Pomba-gira, sendo também executores do carma, aplicam a sentença já definida a quem se destina. Este fato muitas vezes levou alguns umbandistas a entenderem que estes espíritos causam perturbações, mas na lei que eles seguem e executam, se você pede que seja quebrada a perna de um irmão seu, Exu, que segue e executa a lei de causa e efeito, deve quebrar as duas suas. Portanto, Exu não é nem bom, nem ruim, ele apenas segue e executa a lei.

Por outro lado, quando Exu está a serviço nas tendas de Umbanda, na prática da caridade e do bem, usa de seu livre arbítrio para esta prática, e como já mencionamos são espíritos em ascensão, em busca de crescimento e evolução e desta forma quitam dívidas anteriores com a lei, e galgam degraus em sua ascensão espiritual.

Do livro: Umbanda, desafios e soluções, de Michael Pagno

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