A Vida Intelectual

A Vida Intelectual

Podemos dizer que o estudo é Deus tomando consciência em nós de sua própria obra. Assim como toda ação, a intelecção sai de Deus e retorna a Deus através de nós. Deus é sua causa primeira; é sua finalidade última; entre uma e outra, nossas emoções transbordantes podem criar um desvio. Abramos os olhos com sabedoria, para que nosso Espírito inspirador veja.

Submetam-se não apenas a disciplina do trabalho, mas também a disciplina da verdade. Esta é condição indispensável para todo aquele que quer pertencer à verdade. Ela vos pede pronta obediência; e só responde àquele já despojado de todo resto e muito decidido a dedicar-se a ela, unicamente a ela. Cedendo a verdade e exprimindo-a da melhor maneira que pudermos, sem alterações criminosas, exercemos um culto ao qual o Deus interior e o Deus universal responderão revelando-nos serem um mesmo Deus, e estabelecendo uma sociedade com nossa alma.

Como em tudo, convém lembrar-vos das virtudes, e sua importância no reino da inteligência, pois todas as virtudes têm por base a exclusão da personalidade orgulhosa, que repugna a ordem. O orgulho é o pai das aberrações, das falsas criações; a humildade é o olhar que lê o livro da vida e o livro do universo.

Uma grande cultura, enriquecendo um espírito, abre-lhe novos caminhos e aumenta sua capacidade, porém, sem humildade, essa atração exercida pelo exterior é também fonte de mentiras.

Além da humildade, convém ao pensador ter certa passividade de atitude que corresponde a natureza do espírito e da inspiração. Sabemos pouco sobre o espírito, mas sabemos que sua passividade é sua lei primeira. Sabemos ainda menos sobre a inspiração, mas constatamos que ela utiliza mais a inconsciência que as iniciativas. É preciso olhar através do espírito para as coisas, e não no espírito, esquecendo-se mais ou menos das coisas. O espírito está aquilo pelo que se vê, mas não aquilo que se vê: que o meio não nos distraia do fim.

Eis o trabalho profundo: deixar-se penetrar pela verdade, submergir nela docemente, afogar-se; não mais pensar que pensamos, nem que existimos, nem que coisa alguma existe, exceto a própria verdade. Este é o bem-aventurado êxtase.

Para São Tomás, o êxtase é filho do amor; transporta-nos para fora, para o objeto dos nossos sonhos: amar a verdade tão ardentemente que nos concentremos nela e nos transportemos assim ao universal, aquilo que é, ao seio das verdades permanentes. Não vá, pois, se for visitado por este espírito, desencorajá-lo e expulsá-lo fazendo um trabalho completamente artificial e exterior. Se ele estiver ausente, apresse seu retorno com humildes preces. Sob o fulgor divino ganhará em pouco tempo muito mais do que ganharia dedicando-se aos seus pensamentos abstratos. “Nos teus átrios, Senhor, um dia vale mais do que mil”. (SL83,11)

Como não se sentir na presença de Deus quando um homem ensina? Não é ele Sua imagem? Imagem às vezes deformada, mas com frequência autêntica; e essa deformação é sempre parcial.

Texto inspirado no livro “A Vida Intelectual”, de Padre Sertillanges.

Avatar de Michael Pagno

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Todos os textos aqui publicados são de responsabilidade do autor, e não representam necessariamente a opinião da comunidade da Tenda Xangô 7 Raios.