Autor: Michael Pagno

  • Diálogo inter-religioso

    Diálogo inter-religioso

    Elegemos o catolicismo e o protestantismo para estes comentários, pelo fato de serem as religiões com maior expressão na sociedade brasileira. As demais religiosidades, além de serem minoritárias, em especial se forem orientais, não guardam grandes problemas com a Umbanda.

    O espiritismo, que no Brasil se tornou religião, ainda presentemente tem alguns problemas com relação à Umbanda. Àqueles mais intolerantes com o fato de a Umbanda ter abraçado a doutrina de Kardec, esquecem que, o próprio codificador colocou a doutrina espírita como “Filosofia Espiritualista”. Kardec, ao que nos parece, jamais quis fundar uma nova religião.

    Segundo Kardec, qualquer pessoa pode ser espírita, independente da religião que professe, desde que creia na existência dos espíritos e na sua relação com o mundo dos encarnados. Portanto, nada impede que o umbandista seja espírita, estude e professe a doutrina dos espíritos codificada por Kardec.

    Quanto o catolicismo, sabemos que sua relação com a Umbanda não é pacífica, apesar de, na atualidade, com os movimentos sofridos no seio da própria Igreja Católica, a Umbanda não ser combatida pela ala mais progressista da Igreja.

    O protestantismo, por sua vez, é o combatente mais ferrenho da Umbanda. O advento do neopentecostalismo potencializou a rivalidade e os ataques a Umbanda e por extensão a todas as religiões afro-brasileiras.

    Nestes breves comentários, em verdade, temos que as religiões (sejam elas quais forem), são antagônicas, e dificilmente terão uma convivência pacífica, sem ataques umas as outras. Religiões são ideias humanas, e cada uma formula suas doutrinas e filosofias com base naquilo que creiam mais coerentes. Mesmo as religiões afro, neste rol imenso de práticas enquadradas nesta nomenclatura, têm ataques contínuos entre si — não somente em práticas diferentes, mas entre dirigentes de uma mesma religião, em discussões estéreis para saber qual sacerdote tem o ritual correto.

    Contudo, longe de estar aqui fundamentando o não diálogo inter-religioso (sendo que não acredito em tal diálogo honesto), creio que a liberdade dos seres humanos e o respeito a esta liberdade, pode ser uma saída justa e pacífica para tal problema.

  • Os três aspectos da doutrina Espírita

    Os três aspectos da doutrina Espírita

    Por Lydia Mello

    Quando Kardec começou suas observações sobre o espiritismo, percebeu que havia uma abrangência muito maior que os fenômenos em si. Inicialmente Kardec se focou na investigação dos fenômenos para comprovar que eram verdadeiros. Esta é a parte científica.

    Contudo, Kardec percebeu que era possível obter um conteúdo nobre, lógico e diferente de tudo que era conhecido até então e passou a questionar pontos de profundo teor filosóficos, constatando também que essas verdades trazidas por espíritos evoluídos evidenciavam consequências morais e religiosas.

    O Espiritismo abalou as estruturas do misticismo, do sobrenatural, da fé baseada em dogmas, do preconceito, da intolerância e do materialismo e precisava ser muito bem embasada e apoiada em verdades transmitidas pela espiritualidade superior além da prova dos fatos, de modo que não pudesse ser contestada racionalmente. E é por isso que a doutrina espírita deve ser estudada e principalmente compreendida nos três aspectos. Trata-se de um triângulo de forças espirituais…

    Segundo, Emmanuel, “Podemos tomar o Espiritismo, simbolizado como um triângulo de forças espirituais. A ciência e a filosofia vinculam à Terra essa figura simbólica, porém, a religião é o ângulo divino que a liga ao céu.”

    A ciência espírita se ocupa em observar e analisar os fenômenos produzidos por espíritos. Tem como objetivo a existência do espírito, sobrevivência à morte do corpo físico, a reencarnação e a influência dos espíritos sobre os encarnados nos apresentando o perispírito.

    “O Espiritismo e a Ciência se completam um pelo outro; a Ciência, sem o Espiritismo, se acha impossibilitada de explicar certos fenômenos, unicamente pelas leis da matéria; o Espiritismo, sem a Ciência, ficaria sem apoio e exame.” (Kardec )

    A ciência espírita apresenta comprovações sobre a natureza e imortalidade do Espírito; a influência exercida pelos Espíritos e o intercâmbio mediúnico estabelecido entre  encarnados e desencarnados.

    O aspecto científico do Espiritismo desenvolve-se em duas obras de Allan Kardec: o Livro dos Médiuns e A Gênese.

    O Espiritismo é uma doutrina filosófica. Quando estudamos a humanidade, observamos certa questões comuns a muitos povos durante séculos :

    Deus existe ?

    de onde viemos e para onde vamos ?

    por que estamos aqui ?     

    o que existe e como é depois da morte ?

    “O objetivo da evolução, a razão de ser da vida, não é a felicidade terrestre, como muitos erradamente crêem, mas o aperfeiçoamento de cada um de nós, e esse aperfeiçoamento devemos realizá-lo por meio de trabalho, do esforço, de todas as alternativas da alegria e da dor, até que nós tenhamos desenvolvido completamente e elevado ao estado celeste” (Denis)

    Toda doutrina que proporciona uma interpretação à vida, uma visão própria do mundo, é uma filosofia. Assim, estuda os problemas da origem e destinação dos homens, bem como a existência de uma Suprema Inteligência, causa primeira de todas as coisas.

    Examina os atributos de DEUS, suas relações com o Homem e apresenta um código moral, por meio do qual a criatura vai de encontro ao seu Criador. 

    O aspecto filosófico é abordado em O Livro dos Espíritos.

    O conceito de religião está ligada a uma organização sacerdotal, culto, rituais, dogmas e crendices. O Espiritismo nos apresenta a fé raciocinada, sem misticismos, rituais, dogmas e segredos iniciáticos, tendo como lema “fora da caridade não há salvação.”

    O Espiritismo incentiva a prática da bondade, da fraternidade, da humildade, do trabalho  em favor do nosso próximo.

    Allan Kardec, em discurso na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, afirmou, conforme a Revista Espírita de dezembro de 1868 :

    “O Espiritismo não é uma religião”

    O aspecto religioso esclarece sobre as consequências morais do comportamento humano, usando o livre arbítrio e governado pela lei de causa e efeito.

    O aspecto religioso encontra-se abordado em O Evangelho Segundo o Espiritismo.

    Fonte: Portal Mundo Maior

  • Programas Conversas de Terreiro voltaram

    Programas Conversas de Terreiro voltaram

    A doutrina religiosa da Umbanda continua sendo construída. Faço esta afirmação baseado na doutrina Cristã, que levou vários séculos para se consolidar, e podemos dizer que, somente após o século XIII com Santo Tomás de Aquino, temos o cristianismo mais consolidado. Por certo, são muitos os Santos Padres que contribuíram para a solidez do cristianismo e da Igreja, porém, com São Tomás a doutrina Cristã foi colocada a luz da razão.

    A Umbanda, contudo, que conta apenas com pouco mais de um século de existência, apesar de beber nas fontes do cristianismo e da doutrina codificada por Allan Kardec, ainda carece de “santos” que façam o trabalho de solidificar uma doutrina coerente e que, como disse Kardec, possa “olhar a razão frente a frente em todas as épocas da humanidade”.

    Os programas Conversas de Terreiro, durante todo o tempo em que foram produzidos semanalmente (são mais de 320 horas de programas), contam como nossa humilde contribuição para o amadurecimento da doutrina, debatida exaustivamente entre a equipe do programa, que ouviu muitas vozes, e buscou dentro de nossas possibilidades algumas conclusões.

    Colocamos este acervo a disposição de todos, para ser ouvido quando quiser, com os programas sendo veiculados pela nossa Web Rádio 24h no ar. Esperamos sua visita e audiência.

    Um fraterno abraço. ACESSE A PÁGINA DA WEB RÁDIO AQUI

  • Maria Molambo traz mais uma história

    Maria Molambo traz mais uma história

    Estava tomando fôlego e em busca de inspiração para começar estes escritos. Escrever sobre os Guias, Mentores e Protetores de Umbanda sempre é um desafio, mesmo se convivendo com estes espíritos já a um bom tempo. O fato é que estas informações chegaram até nós. Como? Bem, isso é o que menos importa…

    – Salve moleque, vamos escrever?

    — Salve Senhora. Que bom servir, ser útil de alguma forma, meditava sobre isso para começar estes escritos! Claro, quando quiser.

    — Que bom ouvir isso. Esta é a maior realidade que podes refletir. Ser útil é saber sua missão na Terra. Muitos já me perguntaram: Como saber minha missão? Simples. Apenas pergunte a si: O que eu, e somente eu posso fazer e que fará a diferença no meio onde estou? Esta é, sem dúvida, a melhor forma de saber sua missão. Mas, vamos ao trabalho.

    Vou adverti-los que os fatos a seguir não serão completos, porque nem eu mesma os conheço – ou não tenho lembrança – por completo. Regressarei algumas reencarnações para entenderem todo o contexto. Saibam que o regresso a reencarnações passadas não é de acesso a todos os espíritos, limitados ao conhecimento de uma ou duas existências passadas, sendo outras bloqueadas e só sendo descortinadas com o tempo e conforme as necessidades. No meu caso, volto a encarnação que foi chave para toda minha decadência como espírito imortal, e a partir dela, todo um desencadeamento de encarnações posteriores que me foram impostas para saudar dívidas contraídas. Porém, o fato é que a cada nova encarnação, reincidia em erros já cometidos e o resultado eram mais dívidas.

    Pois bem, após este velho espírito tomar fôlego, vamos passear no Império Novo do antigo Egito. Parece estranho este jogo de velho e novo, mas para mim parece que foi ontem. Quando conseguirem adquirir esta noção, de que não sabeis quando iniciou e nem sabes quando terminará, será de grande utilidade para sanar vossas ânsias e medos, a verdadeira noção de eternidade.

    O ano era aproximadamente 1190 antes da era cristã. Permitam omitir nomes e datas exatas, não fará diferença. Eu era então uma grande sacerdotisa do deus Amon. Não era a rainha, esposa do faraó, não confundam. Esta, sim, possuía o título de mão divina, de esposa, adoradora do deus. Eu atuava como seu braço direito, ou, na linguagem atual, era sua suplente. Permitam acrescentar, que o propagado hoje com relação às religiões do antigo Egito não são tão fidedignas, mas posso afirmar que já nesta época, elas davam amostras de decadência. O verniz de alguma moralidade desmoronava com a mais fraca provocação, e a religião já não expressava todo o poder que ostentara em épocas mais remotas.

    Existiam ainda entre os letrados da época crenças particulares, que expressavam concepções elevadas e espirituais da Divindade, quase um mais puro monoteísmo. Concepção de poucos é verdade, mas suas ideias religiosas despertavam a ira tanto das massas quanto dos sacerdotes, apegados a concepção dos deuses. Enfim, se este existia, eles eram o ponto alto que o egípcio individual conseguia alcançar em suas concepções espirituais.

    Contudo, não era o meu caso, nem da nossa casta de sacerdotes e sacerdotisas. Ali a continuidade dos ensinamentos religiosos era mais aparente que real, externa, não interna. Imaginem quando estes ensinos chegaram a Roma. Lá, embora os primeiros imperadores construíssem templos nas linhas antigas e permitissem ser retratados nas roupas de faraó, fazendo oferendas a deuses que nem o nome poderiam pronunciar, eram os suspiros finais disso tudo, e o prenúncio do Salvador. Desculpem, me alonguei nisso, não tem importância, não é?

    – Tem, sim, nobre Senhora. Desculpe, mas me atrevo chamá-la assim. Quanto conhecimento hein? Quantas lembranças…

    — Não te acanhes. Senhora é respeitoso, e devemos respeito mútuo reciprocamente, vivos e mortos não? Vamos adiante!

    Por ser sacerdotisa de um culto que era extremamente sexual, acostumei-me a questão. Eu era alguém que realizava desejos e “desejos”, pois, coitado daquele que não cedesse aos meus. Fui concubina de muitos figurões da época. Ajudava-os com seus desafetos, fiz um punhado de gente fazer a viagem para o mundo dos mortos antes da hora, aliás, eu decidia a hora. Tinha o conhecimento do preparo de poções que envenenavam com muita facilidade, e bastava que um dos meus amantes solicitasse que era prontamente atendido. Por que fazia isso? Bem, não preciso dizer que esta situação não era lícita para mim como sacerdotisa. Arriscava-me em manter encontros com meus amantes, e acima de tudo, poderia ser severamente castigada por utilizar de meus conhecimentos para solução dos seus casos. Mas tudo isso, além da satisfação que sentia em ser importante e desejada, pois minha beleza sempre foi um atributo a meu favor, gozava de certas regalias. A sensação de poder que desfrutava fazia meu ego subir aos céus, e este, sem dúvida, é um caminho perigoso e sedutor. Presencio muitos de vós caindo nesta armadilha. Mas, o fato é que tramei a morte de muitos, inclusive de figuras importantes em Karnak. Tudo isso condenou-me ainda em vida e no pós-morte.

    Ainda encarnada, quando a beleza já não reinava em meu corpo como outrora, o desejo não satisfeito e a perca de posição, fizeram com que me sentisse a pior das mulheres. Os malditos piolhos que eram como ervas daninhas em nosso reino tomaram conta de mim. A depressão que passei a sentir, sem conseguir consertar as coisas com minha magia, fizeram com que uma ideia fixa se apossasse de mim. Acreditava que meu título de sacerdotisa me garantiria no outro mundo, e o suicídio parecia uma saída digna. Quanto engano… Eu havia feito tudo certo: Todos os ritos para garantia de minha entrada no mundo dos mortos foram devidamente feitos por mim antes de tirar minha vida, porém, ao finalizar o ato com um punhal, o desfecho foi outro. . .

    Continua…

  • A provável tenda de Umbanda mais antiga do RS

    A provável tenda de Umbanda mais antiga do RS

    Do blog Registros de Umbanda

    Na postagem Revendo a história do início da Umbanda, de 07 de maio de 2010, fiz o seguinte comentário sobre a provável tenda de Umbanda mais antiga do Rio Grande do Sul:

    “Resta, agora, descobrirmos se Otacílio Charão, antes de embarcar para a África, em 1916, frequentava a TENSP [Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade] ou alguma casa de macumba carioca. Se frequentava a primeira, então teríamos que o Centro Espírita Reino de São Jorge, fundado em Rio Grande, RS, em 1926, é outra tenda descendente da TENSP, mostrando uma relação entre as primeiras tendas de Umbanda e a antiguidade da TENSP sobre todas as demais.”

    Com essa indagação na cabeça, ressolvi pesquisar mais sobre o assunto, ams como moro bem longe o Rio Grande do Sul e conheço quase ninguém por lá, estava bem difícil encontrar algo a respeito de Otacílio Charão e do Centro Espírita Reino de São Jorge (CERSJ).

    Felizmente, por uma dessas agradáveis “coincidências” do destino, pouco tempo depois, no dia 08 de junho de 2010, recebi um comentário na postagem “Um pouco da história da Umbanda – parte 01”, onde o senhor SÍLVIO CRISTOVÃO TORRADA REIS me chamou a atenção por um grave erro que havia cometido lá a respeito do CERSJ.

    Graças a esse meu erro e a iniciativa do senhor Sílvio Reis em me corrigir, a quem fico profundamente agradecido, consegui novas informações bem interessantes sobre Otacílio Charão e o Centro Espírita Reino de São Jorge, que compartilho com vocês abaixo.

    Otacílio Charão era natural da cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, tendo ingressado, por volta de 1916, na Marinha Mercante.

    Em 1926, Otacílio Charão abandona a carreira na Marinha Mercante e retorna ao Rio Grande do Sul, estabelecendo-se na cidade de Rio Grande, onde abriu uma fábrica de doces e balas.

    Ainda em 1926, Otacílio fundou o Centro Espírita Reino de São Jorge, que é, até o presente momento, a mais antiga tenda de Umbanda fundada no Rio Grande do Sul, tendo sido registrado em cartório em 1932.

    É bem provável que Otacílio Charão tenha vindo ao Rio de Janeiro, então capital federal, durante o seu período na Marinha Mercante, mas até agora ainda não consegui provar isso, muito menos que ele tenha frequentado a TENSP, a Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, a Tenda Espírita Mirim ou alguma macumba carioca.

    Apesar disso, pelas características do Centro Espírita Reino de São Jorge, é provável que ele tenha tido contato com a Tenda Espírita Mirim, mas isso é até o momento pura especulação minha. Vejamos, então, como eram as características do CERSJ.

    De sua origem até meados da década de 1970, o CERSJ seguia uma doutrina de Umbanda de Mesa Branca, com as seguintes características:

    • era proibida a utilização de quaisquer instrumentos de percussão;
    • os cantos só podiam ser acompanhados com o bater de palmas e/ou o pé no chão;
    • era autorizada a incorporação de apenas dois Exus, no caso as entidades Exu Tiriri e Exu de Manegum;
    • era proibido o uso de guias ou colares ritualísticos;
    • todos os trabalhos tinham início as 20:00 horas e encerravam-se à meia noite;
    • pessoas separadas ou divorciadas eram proibidas de fazerem parte do quadro de sócios ou de participarem na corrente de trabalhos mediúnicos.

    O uniforme adotado pelo CERSJ da sua fundação até meados da década de 1970 era:

    • para os homens: uma camisa branca contendo um distintivo formado por um ponto riscado e o nome do CERSJ logo acima deste; calça branca; cinto branco; meia branca e sapato de pano e flanela feito por alguns membros do CERSJ;
    • para as mulheres: vestido branco contendo um distintivo formado por um ponto riscado e o nome do CERSJ logo acima deste, com decote fechado e comprimento até cinco dedos abaixo do joelho; bombachinha (espécie de calça curta gaúcha) de tergal branco até debaixo do joelho; meia branca; sapato de pano e flanela feito por alguns membros do CERSJ;
    • para os meninos, que só eram permitidos na corrente por motivos de saúde: camisa azul, calça branca, um cordão amarrado na cintura e sapatos iguais ao dos homens;
    • para as meninas, que só eram permitidas na corrente por motivos de saúde: blusa rosa, vestido branco abaixo do joelho, um cordão amarrado na cintura e sapatos iguais ao da corrente, se fossem meninas.

    Além dessas características, o senhor Sílvio me informou que o CERSJ possui, desde a sua fundação, uma mensalidade utilizada para cobrir seus gastos, estando isento do pagamento da mesma todos os sócios carentes ou que se encontram em dificuldades financeiras.

    No caso da existência de algum sócio nessa condição, era feito um levantamento para descobrir os motivos do fato e, verificada sua autenticidade, os demais sócios eram concitados a ajudar a família necessitada com doações financeiras, de alimentos, roupas e/ou medicamentos.

    Em seus primórdios, o CERSJ não possuía uma sede própria para realizar suas reuniões, utilizando, para tal, a residência de um de seus membros a cada final de semana. Essa situação não perdurou por muito tempo, pois ainda em 1926 foi adquirido o imóvel que serve até hoje como sua sede, o qual está situado na Rua General Abreu nº 497, Cidade Nova, Rio Grande, RS.

    Na década de 1960, o senhor Jesus Penna Rey doou a construção da atual parte da frente da sede do CERSJ, o qual foi utilizado inicialmente para abrigar uma escola primária que funcionava em convênio com a Prefeitura Municipal da Cidade de Rio Grande, com esta cedendo a professora e aquele, o espaço físico e as carteiras escolares. Tal escola funcionou até a reforma do sistema de ensino municipal.

    Até o momento, essas são as informações que conseguimos a respeito do senhor Otacílio Charão e do Centro Espírita Reino de São Jorge, a mais antiga tenda de Umbanda do Rio Grande do Sul, da qual se tem conhecimento. Quem tiver mais informações sobre o CERSJ, por gentileza, deixe um comentário abaixo.

    E para não deixar dúvidas, somos profundamente gratos as informações e aos esclarecimentos prestados pelo senhor SÍLVIO CRISTOVÃO TORRADA REIS, que nos possibilitaram escrever essa postagem.

    Abraços a todos, Renato Guimarães.

  • Exu

    Exu


    As fitas gravadas por Lilian Ribeiro em entrevistas e discursos do próprio Caboclo das 7 Encruzilhadas são um verdadeiro tesouro da Umbanda, patrimônio a ser preservado para estudos e como forma de adentrar naquela realidade dos primórdios da Umbanda. Como já mencionamos, utilizamos aqui algumas transcrições, e sobre Exu sentenciou Zélio de Moraes em entrevista concedida a Lilian Ribeiro em 22 de outubro de 1970:

    Lilian Ribeiro: Sr. Zélio, é sobre o trabalho dos Exus. Existem Tendas que dão consultas com Exus em dias especiais além das consultas normais de Pretos-Velhos e Caboclos. Como o Sr. vê isso?

    Zélio: Eu sei disto, que há muitas Tendas que trabalham com Exus, eu não gosto porque é muito fácil se manifestar com Exu, qualquer pessoa médium, um mau médium se manifesta com Exu, basta ter um Espírito atrasado; ou também fingindo um Espírito, por isso não gosto e fujo disto, na minha Tenda não se trabalha com Exu por qualquer motivo.

    Lilian Ribeiro: Mas o Sr. não considera o Exu um Espírito trabalhador como todos os outros Orixás?

    Zélio: Depois de despertado, porque o Exu é um Espírito admitido nas trevas; depois de despertado, que ele dá um passo no caminho da regeneração é fácil ele trabalhar em benefício dos outros. Assim eu acredito no trabalho do Exu.

    Lilian Ribeiro: Não haverá casos em que outros Orixás vibrando em outras Linhas não possam resolver de imediato alguns problemas de filhos e, não seria o Exu aí o mais indicado para resolver, por estar mais perto materialmente, por estar mais aceito nos trabalhos materiais?

    Zélio: O nosso Chefe, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, nos ensinou assim, isto faz 60 anos, que o Exu é um trabalhador. Como na polícia tem soldado, o chefe de polícia não prende, o delegado não prende, quem prende são os soldados, cumprem ordens dos maiorais, então o Exu é um Espírito que se encosta na Falange, que aproveita para fazer o bem, porque cada passo para o bem que eles fazem vai aumentando a sua luz, de maneira, que é despertado e vai trabalhar, quer dizer, vai pegar, vai seduzir este Espírito que está obsedando alguém, então este Exu vai evoluir. É assim que o Caboclo das Sete Encruzilhadas nos ensinava.

    Lilian Ribeiro: De que modo o Exu é um auxiliar e não um empregado do Orixá ou vice-versa?

    Zélio: Eu não digo empregado, mas é um Espírito que tende a melhorar, então para ele melhorar ele vai fazer a caridade com as falanges, correndo em benefício daqueles que estão obsedados, despertando e ajudando a despertar o Espírito para afastá-lo do mal que ele estava fazendo, então ele se torna um auxiliar dos Orixás

    O entendimento que nos passa o pai da Umbanda Zélio de Moraes é de que Exu e Pomba-gira não são Guias espirituais, portanto, seu trabalho na Umbanda é particular, não sendo igual ao de Caboclo e Preto Velho, acrescentando ainda que a invocação dos Exus deve obedecer às regras rígidas, não sendo chamados por qualquer ocasião. Escolheram o trabalho caritativo para buscar sua ascensão, e prestam seus serviços junto as falanges de Umbanda como auxiliares de grande valia.

    Mestre Omolubá, em suas obras maestrais, legou-nos sobre Exu: A figura Exu – oriundo das plagas africanas – deixa de ser, na Umbanda, um componente enigmático, para firmar-se, com lógica e simplicidade, no esquema de uma comunidade astral extremamente operosa e responsável dentro dos limites impostos pelos mentores da religião de Umbanda.

    … Na Umbanda, a palavra Exu titula uma instituição do plano astral, conhecida como a central dos Sete Focos, composta por milhares de criaturas desencarnadas (branca, pretas, mestiças, atuantes em diversas profissões) que prestam serviços entre os planos físico e astral da nossa terra. Estão dispostos em categorias e recebem a colaboração de espíritos denominados “quiumbas”, que se aferram no trabalho pesado, no desejo natural de serem admitidos na poderosa organização Central dos Sete Focos. (Omolubá,2015, p. 149-150)

    Após estas referências de peso, inquestionáveis para nós meros estudantes de Umbanda, é tarefa fácil sentenciar que Exu e Pomba-gira na Umbanda nada tem de demoníaco ou seres desregrados, marginais do plano astral a serviço das trevas. Ora, todos umbandistas sérios reconhecem que Exu é um espírito que, apesar de ainda habitar os planos inferiores no astral está a serviço do bem e da caridade, operando ao lado dos Orixás e Guias de Umbanda. Os espíritos ascensionados que trabalham na religião precisam de auxiliares que tenham acesso aos planos inferiores, e uma certa liberdade para agir nestes locais. Exu e Pomba-gira sendo habitantes destes, portanto, são os tarefeiros indispensáveis na Umbanda.

    O mundo em que habitamos, o plano físico, é uma cópia imperfeita do mundo espiritual, nos ensinam os Guias de Umbanda. As estruturas deste mundo são cópias das existentes no outro. As obras do médium Francisco Cândido Xavier, psicografadas por André Luiz, como “Nosso Lar”, retratam bem este quadro. Estruturas existentes no mundo espiritual já a muito tempo, agora são realidades no nosso; muitas ainda virão. Pois bem, se os mundos são cópias um do outro, entende-se muito melhor o papel de Exu: quando de uma incursão policial para prender malfeitores em áreas dominadas pelo narcotráfico, pedimos ao juiz que o faça ou solicitamos aos policiais treinados para tal empreitada? No astral, quando os Guias solicitam a retirada e consequente prisão de espíritos malfeitores, ordenam aos Exus e Pomba-gira que o façam, pois são espíritos que habitam os planos inferiores e, portanto, conhecem o território e todos os seus perigos. São hábeis em capturar, prender e neutralizar as ações de espíritos decaídos que, quando aferrados em seus planos contra encarnados, podem causar desde pequeno mal-estar, até doenças as mais graves, não sendo diagnosticadas pela medicina tradicional. Influem em nossos pensamentos, levando ao desgosto pela vida e sugerindo o suicídio, causam apatias, nervosismo e uma gama de outros males, inclusive financeiros.

    O Exu e Pomba-gira de Umbanda, longe de serem aqueles que se vendem por uma garrafa de cachaça para causar estes males listados e muitos outros a nós, encarnados, são os que o combatem. Os espíritos decaídos, cultuados por outras modalidades religiosas, usam os nomes dos Exus de Umbanda para assim ganharem credibilidade frente aos incautos que vão em busca de seus serviços para ferir seus desafetos.

    Existem hoje tendas de Umbanda – se é que podemos as chamar assim – que adotaram o estilo de trabalho de outras religiões, que não são nosso objeto de estudo, e usam os Exus e Pomba-gira para finalidades nada nobres. Somos cientes de que os verdadeiros Exus de Umbanda já os abandonaram, e ficaram os velhacos e sorrateiros malfeitores do astral, utilizando os nomes dos Exus de Umbanda, cobrando vultuosas oferendas para supostos ataques aos inimigos encarnados do solicitante, e tecendo redes que envolvem os desavisados que pactuam com estes espíritos. Afirmamos que a Lei de Causa e Efeito é implacável para todos nós, encarnados e desencarnados.

    Dentro da Lei de causa e efeito, dizemos que também aqui a justiça divina necessita de executores, quando já exista um julgamento nos tribunais cármicos contra algum ser vivente, seja do mundo dos vivos ou dos mortos. Exu e Pomba-gira, sendo também executores do carma, aplicam a sentença já definida a quem se destina. Este fato muitas vezes levou alguns umbandistas a entenderem que estes espíritos causam perturbações, mas na lei que eles seguem e executam, se você pede que seja quebrada a perna de um irmão seu, Exu, que segue e executa a lei de causa e efeito, deve quebrar as duas suas. Portanto, Exu não é nem bom, nem ruim, ele apenas segue e executa a lei.

    Por outro lado, quando Exu está a serviço nas tendas de Umbanda, na prática da caridade e do bem, usa de seu livre arbítrio para esta prática, e como já mencionamos são espíritos em ascensão, em busca de crescimento e evolução e desta forma quitam dívidas anteriores com a lei, e galgam degraus em sua ascensão espiritual.

    Do livro: Umbanda, desafios e soluções, de Michael Pagno

  • Santa Catarina e a feiura da alma em pecado

    Santa Catarina e a feiura da alma em pecado

    Uma noite, enquanto dormia, Catarina sonhou com a Rainha do Céu, envolta numa admirável beleza, trazendo nos braços o seu divino Filho. Este, porém, virando-lhe o rosto com descontentamento, disse que Catarina era feia, porque não havia sido batizada…

    Por Pe. Franz X. Weninger, S.J. Traduzido para o português.

    Santa Catarina nasceu em Alexandria, de pais pagãos. Era dotada de grande beleza pessoal, e possuía uma inteligência tão extraordinária, que dominava todas as ciências existentes na época em sua cidade natal. A única da qual não tinha conhecimento era a da salvação eterna, mas finalmente obteve-a da seguinte forma: enquanto dormia, teve a impressão de que a Rainha do Céu aparecia-lhe envolta numa admirável beleza, trazendo nos braços seu divino Filho. Ele, porém, virando o rosto para ela com descontentamento, disse que Catarina era feia, porque não fora batizada. 

    Ao acordar, começou a pensar no sonho que teve e recebeu uma inspiração do Céu para tornar-se cristã. Após receber a devida instrução, recebeu finalmente o santo Batismo. Posteriormente, a Virgem Santíssima apareceu-lhe novamente em sonho ao lado de Cristo, que, olhando com ternura para Catarina, pôs um anel em seu dedo como sinal de que a escolhera por esposa. Ao acordar, encontrou um anel em seu dedo e, sem demora, decidiu consagrar a virgindade ao Senhor e tornar-se uma cristã mais zelosa.

    Maximino, o imperador, tinha estabelecido certo dia para celebrar um sacrifício público em honra dos falsos deuses, e todos os habitantes da cidade foram obrigados a participar. Catarina ficou muito triste por ver que o povo honrava o demônio daquela maneira e não conhecia o verdadeiro Deus. Munida de coragem, entrou destemidamente no templo, onde o imperador assistia pessoalmente ao sacrifício, e, dirigindo-se a ele com liberdade cristã, mostrou-lhe como ele era cego por adorar ídolos e tentou convencê-lo da veracidade do cristianismo.

    Santa Catarina subjugando o imperador. Pintura de Claudio Coello.

    O imperador ficou muito surpreso com o fato de uma donzela ter ousado falar daquela maneira com ele, mas, ao mesmo tempo, ficou fascinado com a aparência e a eloquência de Catarina. Tão logo ele retornara ao palácio, Catarina foi novamente ao seu encontro e falou com tanta veemência sobre a falsidade dos deuses pagãos e a autenticidade da religião cristã, que o imperador não soube o que responder. 

    Aquilo que era incapaz de fazer, pensava que outros poderiam fazer por ele. Então, convocou alguns dos homens mais eruditos para que respondessem aos argumentos de Catarina e a persuadissem a renunciar à fé cristã. Deus, porém, que, por meio de uma frágil donzela, poderia reduzir a nada a sabedoria dos pagãos, inspirou Santa Catarina com tal eloquência, que ela conseguiu convencê-los de seu erro. E o fez com tal perfeição, que renunciaram a ele publicamente  e proclamaram a fé cristã como a única verdadeira. O imperador, furioso com um desfecho tão inesperado, ordenou que aqueles novos confessores de Cristo fossem imediatamente executados. 

    Em seguida, procurou fazer com que Catarina abandonasse a fé por meio de lisonjas e promessas; e quando viu que suas palavras não impressionavam a virgem, começou a ameaçá-la e, finalmente, mandou torturá-la. A santa foi açoitada com tanta crueldade e por tanto tempo, que todo o seu corpo ficou coberto de feridas, das quais o sangue escorria sem cessar. Os espectadores choravam de compaixão, mas Catarina, fortalecida por Deus, permanecia com os olhos voltados para o Céu, sem manifestar qualquer sinal de medo ou sofrimento. 

    Após esse terrível castigo, Catarina foi levada a um calabouço e, por ordem do imperador, deixaram-na sem comer, para que pudesse definhar lentamente. Mas Deus enviou-lhe um anjo para remediar suas feridas e consolá-la. Depois, Ele mesmo apareceu-lhe pessoalmente, encorajou-a a lutar com bravura e prometeu-lhe a coroa da glória eterna. Quando viu as feridas de Catarina curadas, e a virgem resplandecente com uma beleza mais do que humana, emudeceu de espanto. A santa fez desse milagre uma ocasião para lhe falar da onipotência do Altíssimo e da farsa que eram os deuses pagãos. Falou com uma eloquência tão impressionante que tanto a imperatriz como Porfírio prometeram abraçar o cristianismo.

    “Decapitação de Santa Catarina”, pelo Mestre de Colônia, século XV

    Alguns dias depois, quando o imperador soube que Catarina não só ainda vivia como estava mais forte do que nunca, chamou-a à sua presença e voltou a assediá-la com promessas e ameaças. Porém, ao verificar que ela permanecia tão firme quanto antes, ordenou que fosse amarrada a uma roda cheia de pontas afiadas e facas. A heroína cristã não ficou horrorizada com essa ordem desumana, e invocou a Deus com confiança inabalável. Quando os carrascos a prenderam e ataram à roda, o Todo-Poderoso enviou um anjo que soltou os grilhões e despedaçou a roda. Muitos dos espectadores, ao presenciar esse milagre, exclamaram a plenos pulmões: “Grande é o Deus dos cristãos! Só Ele é o verdadeiro Deus!” 

    Maximino permaneceu cego e pensava em novos tormentos, quando a imperatriz se aproximou, censurou-o pela barbaridade cometida contra uma donzela frágil e inocente, e confessou corajosamente que ela mesma não reconhecia nem adorava outro deus senão o Deus dos cristãos. O tirano, ao ouvir tais palavras, perdeu o controle e ordenou que a imperatriz e Porfírio fossem imediatamente decapitados, e que Catarina, como inimiga dos deuses, fosse levada para a praça pública e morta pela espada. 

    A destemida virgem dirigiu-se com alegria até o local indicado, exortou todos os circunstantes a abandonar a idolatria, rezou a Deus pela conversão deles e, em seguida, recebeu o golpe que enviou sua alma para o Céu. Alguns autores antigos testemunham que do corpo de Santa Catarina saiu leite em vez de sangue, como acontecera na morte de São Paulo; e acrescentam que seu corpo foi milagrosamente transportado por anjos e sepultado no Monte Sinai, na Arábia.

    Fonte: Site Padre Paulo Ricardo